sexta-feira, 12 de maio de 2017

Conversas d'Ouvido com Camará


A dupla brasileira Camará é o fruto da amizade entre Raphael Amoroso (violão) e Victor Cremasco (voz). Em 2015 editaram o segundo LP, Bonsai, este ano preparam uma mini digressão pelo nosso país agendada para o mês de Outubro. Como não conseguimos esperar até ao Outono, decidimos aproveitar o espírito primaveril para uma entrevista inserida nas "Conversas d'Ouvido"...


Ouvido Alternativo: Como surgiu a paixão pela música?
Raphael Amoroso (RA): O meu pai também é músico, acompanhou o Adoniran Barbosa por algum tempo. Mas a paixão mesmo vem das festas em família: o meu pai com o seu violão fazendo a trilha sonora. Já os meus avós cultivavam a arte de ouvir. Na sala deles sempre tocava muito Carlos Gardel e Frank Sinatra.
Victor Cremasco (VC): Veio da família, com certeza. Sou filho de atriz cantante, sobrinho de dois vocalistas de rock, neto de amante de ópera. Fui herdeiro bem-aventurado desse contexto.

Como surgiu o nome Camará?
Um refrão de Tom Jobim diz: “água de beber, camará”. Entre pesquisas e deduções, nunca soubemos ao certo o significado de “camará”. Escolhemos pela apócope de “camarada”, representando a nossa profunda amizade, pedra fundamental do Camará.

Este ano virão a Portugal para uma mini-digressão, o que esperam desses concertos?
RA: Uma magnífica oportunidade. Esperamos, com sorte, conquistar alguns corações do outro lado do oceano.
VC: Serão uma bela história para contar na posteridade.

Como gostam de descrever o vosso estilo musical?
RA: Uma mistura boa de samba antigo com bossa nova.
VC: É um “desestilo”. São muitas referências, muitos ritmos, um caos que alguns poderiam classificar como ausência de identidade, mas que para nós é liberdade, grandeza de intenção.

Para além da música, têm mais alguma grande paixão?
RA: Poesia e futebol. Pastéis de nata, também.
VC: Poesia, comida… Na verdade a minha grande paixão é ter prazer. Sou um hedonista inveterado.

Qual a maior vantagem e desvantagem da vida de um músico?
RA: A minha relação com a música é despretensiosa, não vejo uma desvantagem.
VC: O maior privilégio é poder estar num palco junto de amigos e sentir aquela conversa acontecendo na forma de olhares e sons. Desvantagens ainda não.

Quais as vossas maiores influências musicais?
RA: Jobim, Gil, Caetano, Chico, Milton Nascimento e Guinga.
VC: Típica pergunta que dá um nó na gente. São muitas, mas fico com Vinicius de Moraes, pois acho que ainda sou mais um poetinha que, acidentalmente, descobriu saber cantar. Citaria os meus tios (Nando Fernandes e Rogerio Fernandes) no sentimento, e Chico no todo, insuperável.

Como preferem ouvir música? CD, Vinil, K-7, Streaming, leitor mp3?
RA: Vinil.
VC: Estando alta e em boa qualidade, qualquer formato.

O streaming está a “matar” ou a “salvar” a música?
RA: O streaming é mais uma ferramenta. O moto-contínuo está aí. O importante é fazer música com sentimento.
VC: A manter. Penso que quem mata ou salva a música são os compositores e músicos, não os meios.

Qual o disco da vossa vida?
RAO próximo.
VC: “Clube da Esquina” (1972) é um diamante. Talvez seria o disco que eu guardaria como registo da música, um tipo de arte que se fazia na Terra…

Qual o último disco que vos deixou maravilhados?
RA: "Carminho canta Tom Jobim".
VC: “Movimento”, Aline Frazão.

O que andam a ouvir de momento/Qual a vossa mais recente descoberta musical?
RA: Ando ouvindo "Cheiro Verde" de Danilo Caymmi.
VC: Esta semana, Belchior, poeta das coisas simples que nos deixou há pouco. Infelizmente nós ainda temos essa mania de desvendar a vida na morte.

Para quem gostariam de abrir um concerto?
Chico Buarque.

Em que palco (nacional ou internacional) gostariam um dia de actuar?
RA: Em Portugal, no Espaço Espelho d'Água ou quem sabe no Anfiteatro ao Ar Livre da Fundação Calouste Gulbenkian :)
VC: Sala Adoniran Barbosa, do Centro Cultural São Paulo, e plateia externa do Auditório Ibirapuera.

Qual o melhor concerto a que já assistiram?
RA: Caetano e Gil - "Dois Amigos, Um Século de Música", em 2015.
VC: Ney Matogrosso. Ele é o asmodeu dos asmodeuses.

Que artista ou banda gostavam de ver ao vivo e ainda não tiveram oportunidade?
RA: Cartola.
VC: Elis Regina, Secos & Molhados e Luciano Pavarotti.

Qual o concerto da história (pode ser longínqua, mesmo antes de terem nascido) em que gostariam de terem estado presentes?
RA: Nos festivais de 67.
VC: Crosby, Stills, Nash & Young em Woodstock.

Qual o vosso guilty pleasure musical?
RA: Não relaciono a música com culpa.
VC: Agepê e Benito di Paula. No volume máximo.

Projectos para o futuro?
RA: Seguimos talhando e espalhando nossa música sem fazer muitos planos. Quem diria que um dia estaríamos prestes a fazer uma turnê por Portugal?
VC: Continuar sendo capaz de compor. Compositores sempre têm o pesadelo de que a fonte um dia vai secar.

Que pergunta gostariam que vos fizessem e nunca foi colocada? E qual a resposta.
RA: Qual a cor da sua meia? Amarelo.
VC: Traduzir uma parte na outra parte, será arte? Essa é a pergunta que remata o poema “Traduzir-se”, de Ferreira Gullar. Eu responderia que sim, muito.

Que música gostariam que tocasse no vosso funeral?
RA: "Corumbá", do disco instrumental do Almir Sater.
VC: Alguma música minha. Sinto que essa música ainda não chegou.

Obrigado pelo tempo despendido, boa sorte para o futuro.

Enquanto aguardamos as estreia por terras lusas, apresentamos o single "Há Braço".

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